Michael Sandel promove debate sobre desigualdade social e justiça

O que podemos fazer juntos para a democracia funcionar melhor? O filósofo político e professor de Harvard Michael Sandel apontou alguns caminhos na conferência do Fronteiras do Pensamento que realizou na noite desta segunda-feira (26) no Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Autor do best-seller Justiça e do livro O que o Dinheiro não Compra, o professor trouxe para Porto Alegre uma mostra de seu curso, frequentado por mais de 15 mil pessoas em Harvard. (As aulas foram disponibilizadas na íntegra no site).

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O professor de Harvard acredita que o papel protagonista do dinheiro é corrosivo para a democracia (Luiz Munhoz/Divulgação/Fronteiras)

No lugar da usual explanação, ele surpreendeu o público de mais de 1.500 pessoas com questões como “o jogador de futebol Neymar merece ganhar muito mais dinheiro do que um professor da rede pública de ensino?” e “seria justo pagar um cambista para furar a fila em um hospital público?”, promovendo debates entre as pessoas da platéia e rebatendo os argumentos levantados. Para Sandel, “a maneira como debatemos questões políticas parece vazia, sem um propósito maior”, e o discurso político é muitas vezes tecnocrático, sem levar a lugar nenhum. “As pessoas estão frustradas com a política e eu tenho a impressão de que essa frustração não é desconhecida aqui no Brasil”, afirmou, levando os espectadores ao riso.

O professor acredita que há três desafios a serem superados para atingir uma sociedade mais justa. “Um deles é a corrupção, que eu sei que também é um grande problema no Brasil”, destacou, citando o superfaturamento de alguns estádios construídos para a copa do mundo no país. “Um segundo desafio tem a ver com a crescente lacuna entre os ricos e os pobres, que pode acabar com o senso de comunidade, de que deveríamos nos preocupar uns com os outros”, acrescentou.

O terceiro obstáculo é o papel cada vez mais importante que o dinheiro e o mercado representam em nossas vidas. “Um dos argumentos a favor de deixar o mercado decidir a distribuição da riqueza é o argumento moral de respeitar as escolhas individuais e de deixar que o indivíduo pague o que acha que deve pelo bem que consome”, Sandel afirmou. Essa visão justificaria o fato de Neymar ganhar imensamente mais do que um professor e de uma pessoa poder pagar um cambista para um lugar melhor na fila. Mas, para o filósofo, “as escolhas que devemos fazer em prol do bem social são mais importantes que as escolhas individuais”.

Fazendo uma analogia com os estádios de baseball que ele freqüentava quando criança, Sandel contou que, aos poucos, os estádios ganharam camarotes, o que fez com que as pessoas vissem os jogos de maneira diferente conforme o dinheiro que tinham. “Com isso, ir a jogos de futebol foi se tornando menos e menos um lugar de encontro de pessoas diferentes. É isso que está acontecendo na sociedade”, reiterou. Segundo o relatório Credit Suisse Global Wealth Report , divulgado em 2013, metade da população mundial detém apenas 1% da riqueza global, enquanto 10% detém 86% de toda a riqueza.

Como queremos viver juntos? Queremos uma sociedade onde tudo está a venda ou há bens morais que o dinheiro não pode comprar? Para Sandel, “a democracia precisa que pessoas de diferentes experiências se encontrem e dialoguem”. Ele defende que a aceitação das diferenças e o diálogo podem construir um mundo melhor. “Se recusar a participar do debate sobre grandes questões éticas não é ser neutro. Se nós não decidirmos essas questões, o mercado decidirá por nós”, concluiu o professor.

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Nortista vivendo no sul. Escreve preferencialmente sobre políticas culturais, culturas populares, memória e patrimônio.
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