Uma tarde de amor livre na Redenção

A banda Apanhador Só fez mais um de seus shows acústicos na redenção (Foto: Nicole Silveira)
A banda Apanhador Só fez mais um de seus shows acústicos na redenção (Foto: Nicole Silveira)

Na sexta-feira, dia 26 de junho deste ano, a Suprema Corte dos Estados Unidos legalizou o casamento homoafetivo em todo o EUA, um grande avanço em busca dos direitos igualitários do movimento LGBT. Uma conquista pelo direito de amar e pelo reconhecimento de todas as famílias.

Essa vitória dos direitos igualitários foi mais um combustível para a Parada de Lutas LGTB, que aconteceu no Parque Farroupilha, no domingo, 28 de junho, Dia Internacional do Orgulho LGBT. Entre apresentações musicais – que iam desde a funk, rap e covers de Amy Winehouse e Adele – os organizadores reforçavam as pautas do movimento, como os diversos casos de violência contra homossexuais, e davam exemplos de países que passaram a ter leis mais rigorosas contra a homofobia. Com tudo isso, as pessoas transitavam pelo local, carregando a bandeira arco-íris – símbolo do movimento -, com adesivos no peito ou rostos pintados. Casais sentiam-se livres.

Logo ali, no outro lado da Redenção, próximo ao Arco, aos poucos as pessoas iam se acomodando na grama, estendendo suas cangas, colocando a água quente no chimarrão, comprando uma pipoca ou uma cerveja. Conversavam umas com as outras, brincavam com seus cachorros, fumavam um cigarro. Todos iam formando um círculo, à espera do show acústico da banda Apanhador Só (que já provocava transes coletivos em 2010).

Esse formato de show, intitulado pela banda como Show Acústico Sucateiro Crowdfundístico, teve o objetivo de arrecadar dinheiro para realizar a gravação do novo CD e uma turnê nacional, passando por todos os estados do país. O crowdfunding é um método tem sido cada vez mais comum no cenário cultural underground (Dingo Bells é só mais um exemplo entre as bandas) e é uma forma de ajudar os artistas a produzir seus conteúdos, sem que precisem de auxilio de gravadores. Dessa forma, é possível que qualquer conteúdo tenha seu espaço, visibilidade.

Formada por Alexandre Kumpinski, Felipe Zancanaro, Fernão Agra e André “Foca” Zinelli, esse estilo de tocar no meio das pessoas já é utilizado pela banda há algum tempo. É uma forma de estar mais próximo do seu público. Como a arte de rua, a intenção é que as pessoas que passam pelo local possam desfrutar de uma boa música, seja por dois ou por 45 minutos. Com exceção de Alexandre, que se manteve no violão e voz, os demais integrantes revezavam nos instrumentos: um bumbo, pratos, percussão, e objetos derivados de sucata, como um balde ou uma roda de bicicleta. Pessoas da plateia, que o vocalista chamou para “fazer um barulho mais alto”, tocavam percussão, violão, violoncelo e até mesmo ukulele.

Na tarde, a banda, que tem projetos de financiamento coletivo, passou o chapéu (Foto: Alass Derivas)
Na tarde, a banda, que tem projetos de financiamento coletivo, passou o chapéu (Foto: Alass Derivas)

Com tudo pronto, a banda começou a tocar “Maria Augusta”, música do seu primeiro CD. O público ainda estava tímido, sem saber se deveria cantar junto ou só apreciar o som. Depois vieram “Vila do ½ dia” e “Torcicolo”. Em seguida eles tocaram três músicas do primeiro trabalho, e isso fez o público animasse um pouco mais, era possível ouvir o coro entoar frases como Não leve a mal / Eu só queria ter outra filosofia / mas não nasci para conversar com rei, da música “Um Rei e um Zé”, ou O nosso amor / uma garrafa de vinho / virando vinagre devagarinho, da doce “Peixeiro”. O vocalista então realizou um breve intervalo para avisar sobre o objetivo do show e pedir para que todos apoiassem o projeto.

Quando a banda voltou a tocar, o público já estava menos tímido que no inicio, e ajudou o grupo a cantar a delicada “Bem-me-Leve”, Eu queria ser um avião bem leve / pra sobrevoar o teu terraço e tapar teu sol e a entoar o coro de  “Na Ponta dos Pés”. Para encerrar o segundo bloco do show, três músicas do segundo CD: “Líquido Preto”, “Despirocar” e “Não se Precipite”.

Porém, se no início, quando tocaram “Maria Augusta”, o público estava tímido, no final, quando no bis, repetiram a música, todos se levantaram e dançaram o arrastapé que a música cita e ajudaram a entoar o coro Tô rouco de saudade de você, fazendo assim um dos momentos mais lindo do show. No final, a banda se levantou, começou a recolher seus instrumentos. Algumas pessoas foram tirar fotos com os integrantes ou foram passear pela Redenção.

Provavelmente todos ali continuaram seguindo a vida como antes, como se nada tivesse acontecido. Mas em um dia que tem um evento de luta pelo direito das pessoas amarem e uma banda cantando músicas suaves e que falam de amor, é inevitável perceber que este foi um dia em que o sentimento transbordou pela Redenção. Um dia que vai perpetuar por bastante tempo na memória das pessoas que estiveram ali. Mesmo que bem lá no fundo. Quem sabe um dia, todas as tardes poderão ser assim.

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