Ato político cultural entrou pra história ao pedir “Diretas Já” e ecoar vozes plurais no Rio

Com informações do Brasil de Fato
Fotos: Mídia Ninja

As imagens registram um verdadeiro mar de gente na orla de Copacabana: 150 mil, segundo a organização. O ato político-cultural que ocorreu no domingo (28) na orla de Copacabana pode entrar para a história política do país como uma das principais mobilizações por “Diretas Já”. Foi assim também em 1984 quando milhares de pessoas foram às ruas contra a ditadura militar e também pediram eleições diretas. A manifestação pediu a renúncia de Michel Temer, além de pressionar o Congresso Nacional a aprovar uma emenda à Constituição que permita eleições diretas para presidente da República.

O protesto foi convocado por artistas e organizado pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, iniciativas que reúnem centenas de movimentos populares, centrais sindicais e diferentes partidos de esquerda. Mas se a história se repete como tragédia e depois como farsa,  havia algo inédito que nem o velho Marx poderia prever: além dos protestos contra Temer, o ato ecoou as vozes plurais dos movimentos da população negra e LGBT, com artistas do samba e do rap liderando o protesto.

Mart’nália foi uma das presenças do ato Rio Pelas Diretas (Foto: Mídia Ninja)

No começo da tarde, depois de diversos discursos de lideranças de movimentos sociais e artistas globais, Pretinho da Serrinha, Mart’nália, Teresa Cristina e Otto desfilaram clássicos do samba. Entre uma música e outra, Teresa lembrou que “não tem nenhum preto [investigado] na lava-jato”, Negro Belchior pediu a liberdade de Rafael Braga. Alguém leu no alto do trio um recado da travesti e ativista Indianara Siqueira, puxando um coro em ritmo de funk: “As bi, as gay, as trava, as sapatão tão tudo organizada pra fazer revolução!”. E também teve espaço pra poeta Elisa Lucinda ler um sucesso de sua autoria:

Meu coração está aos pulos!
Quantas vezes minha esperança será posta à prova?
Por quantas provas terá ela que passar?
Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam
entupidas de dinheiro, do meu dinheiro, que reservo
duramente para educar os meninos mais pobres que eu,
para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus
pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e
eu não posso mais. (“Só de Sacanagem”, de Elisa Lucinda).

O ator Wagner Moura atuou como mestre de cerimônia do evento cultural e político. “Não é possível que Michel Temer siga sendo presidente. Também não é possível que o próximo presidente seja escolhido por esse Congresso, cúmplice do golpe e que tem 200 deputados investigados. Pode ser legal, mas não é legítimo. Temos direito de votar e queremos eleições diretas. Essa não é uma festa de esquerda, nem de direita, essa é uma festa da democracia”, argumentou Moura. Ao considerar o espectro político do Brasil, no entanto, o protesto foi sim de esquerda. Isso porque enquanto uma bandeira verde e amarela se destacava na multidão, a pauta do ato era também contra as reformas trabalhista e da previdência. Alguém aqui imagina a direita ler um recado de uma travesti em qualquer ato?

Mano Brown e Rappin Hood representaram o movimento hip-hop (Foto: Mídia Ninja)

Mais para o fim do dia, foi a vez de Mano Brown e Rappin Hood entrarem pra história com vários gritos de Fora Temer e Diretas Já, seguidos por Criolo, com seu mais novo mantra”meninos mimados não podem reger a nação”. Pedro Luis, BNegão e DigitalBlus encerram a noite,  mas antes, Caetano Veloso (ao lado de Maria Gadu) e Milton Nascimento provocaram algo como uma catarse coletiva. O artista tem que ir aonde o povo está, cantou Milton, em uma aparição rápida. Mas ver Caê cantando “Podres Poderes” e “Sem Lenço, Sem Documento” foi o momento mais óbvio de que assistimos à história sendo feita ao vivo.

Enquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Índios e padres e bichas
Negros e mulheres
E adolescentes
Fazem o carnaval…

Caetano e Milton protagonizam um momento de catarse com clássicos doa anos 1960 e 70(Foto: Mídia Ninja)

 

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