Bienais de artes visuais promovidas por instituições do Brasil têm enfrentado críticas internas de funcionários insatisfeitos com condições de trabalho e problemas relativos à remuneração. Os casos ocorrem este ano com a Bienal de São Paulo e a Bienal das Amazônias, mas também foram registrados em 2022 na Bienal do Mercosul.
Na Bienal das Amazônias, que está na sua primeira edição, com sede em Belém (PA), os problemas têm relação com atrasos nos salários. O Nonada apurou com diversas fontes que alguns trabalhadores passaram por um processo de treinamento, mas só receberam dois meses depois. Outros funcionários e artistas ainda não haviam recebido nenhuma parcela do pagamento até o início de outubro. O evento iniciou em agosto.
Por email, a Bienal das Amazônias informou à reportagem que “é um projeto incentivado e cuja execução depende diretamente de patrocínios, sendo que aportes seguem trâmites internos de cada parceiro e independem dos calendários desta primeira edição”. Os pagamentos estão previstos para serem realizados até dia 31 de outubro, uma vez que houve novo aporte de patrocinadores.
Segundo a nota dos organizadores, “não tem sido fácil realizar esta que é a primeira Bienal a reunir artistas de toda a panamazônia em uma iniciativa da sociedade civil, mas estejamos certos que, ainda que a realização do trabalho esteja aquém do aguardado por muitos, fazemos parte da história da arte contemporânea amazônica e consequentemente, brasileira. Esta primeira edição tem sido, sob muitos aspectos, um aprendizado para todos os envolvidos e aos que estão caminhando conosco o nosso mais sincero agradecimento.”
Nesta quarta (18), em carta aberta divulgada pela Revista Select, trabalhadores da 35ª Bienal de São Paulo dizem que estão submetidos a “condições de trabalho que vão desde o vale-refeição abaixo do mercado e insuficiente para uma alimentação adequada até a carga de trabalho extenuante, o ambiente com calor excessivo, causando desmaios, a espera de até três horas para um revezamento que permita ir ao banheiro”.
Os trabalhadores também afirmam que estão sofrendo assédio moral e que a Bienal não tem cumprido regras de acessibilidade e de adoção do nome social de pessoas LGBTQIA +. A carta enfatiza a situação dos mediadores, destacando que a área educativa da Bienal e “o trabalho da mediação está subordinado, nesta edição, à uma Coordenação de Produção, acarretando uma condição de desrespeito a todo o processo educativo e replicando o padrão de desvalorização dos profissionais da área da educação.”
Em nota, a Fundação Bienal de São Paulo diz que recebeu com surpresa os questionamentos. “É fundamental que reste esclarecido que, objetivamente, os salários pagos pela Fundação Bienal estão em absoluta consonância com os melhores valores praticados no mercado, conforme se pode depreender de rápida pesquisa comparativa. Da mesma forma, o ambiente e a jornada de trabalho atendem plenamente à legislação trabalhista, às convenções coletivas e às melhores práticas de gestão. O Pavilhão da Bienal é acessível e a Fundação Bienal contou com assessoria da consultoria Mais Diferenças na elaboração de uma política de acessibilidade.” A instituição também informou que vai investigar as acusações.
Em 2022, o Nonada publicou uma carta assinada pelos mediadores da Bienal do Mercosul, que ocorre em Porto Alegre (RS), na qual os trabalhadores respondiam a uma fala do curador da edição 13 do evento, Marcello Dantas. Os mediadores chegaram a colar cartazes nas paredes dos museus em protesto ao curador, que, segundo a carta, chamou os trabalhadores de “xenófobos” por se recusarem a participar de uma obra do artista alemão Tino Sehgal. “Não havia previsão de pagamento aos mediadores para participar da realização da obra, como erroneamente fora divulgado por Dantas. Essa foi mais um fala inverídica proferida pelo curador”, detalha a nota. A mesma edição também passou por problemas com artistas, que desistiram de participar após terem recursos cortados.
Há 10 anos, na Bienal 9, a instituição também sofreu críticas e foi acusada de promover práticas elitistas, como “lista VIP”, prejudicando o acesso do público geral, além de fazer com que os profissionais da área de educação se desviassem de suas funções, trabalhando como recepcionistas e ascensoristas.