Por Nicolas Sales*
Cabaret é um musical com mais de 40 anos. Sua primeira produção ganhou diversos Tony Awards (prêmio voltado para as peças da Broadway), incluindo o de Melhor Musical. Já a adaptação para o cinema levou oito Oscars. A mais nova versão brasileira chegou a Porto Alegre no Teatro do Sesi na última quinta-feira (21) e se despediu nesse domingo, dia 24, com praticamente todos os ingressos vendidos. O sucesso inesgotável do espetáculo comprova uma coisa: todos desejam passar uma noite em Berlim, no Kit Kat Club.
Miguel Falabella é o responsável pelo roteiro e pelas letras em português das músicas originais. O seu grande triunfo é transformar a história multinacional em uma trama atraente para o público brasileiro. Dessa forma, a inglesa Sally, a principal atração do cabaré Kit Kat Club, e o seu desajustado romance com o escritor americano Cliff, enfim, todo esse contexto da Berlim nos anos 1930 que os rodeia torna-se uma realidade palpável através do coloquialismo da nossa língua.
A abordagem do enredo faz um importante contraste com a leveza do roteiro. O início da perseguição aos judeus, a promiscuidade no clube e a possível homossexualidade de Cliff são assuntos tratados com delicadeza e, ao mesmo tempo, profundidade. Além disso, a polêmica em volta de tais temas faz de Cabaret uma narrativa completamente atual. A sensação transmitida quando as imagens das suásticas descem no palco, por exemplo, é provocadora e marcante, denotando como a história permanece realista mesmo com o passar do tempo.
Embora sejam de Claudia Raia e Guilherme Magon os papéis principais (Sally Bowles e Cliff Bradshaw), o destaque no elenco vai para Jarbas Homem de Mello, que interpreta o mestre de cerimônias do Kit Kat Club. A performance que o ator desenvolve durante o espetáculo é, em parte, produto da interação com a plateia, o que comprova a sua versatilidade a cada apresentação. Jarbas ainda assume uma linguagem corporal curiosa, misturando trejeitos masculinos e femininos, dando ao personagem a indefinição necessária para gerar controvérsia. Esses elementos também consagraram a atuação de Joel Grey, vencedor do Tony e do Oscar pela sua atuação na versão original e na adaptação para o cinema de 1972.
Os números musicais contam, ainda, com a coreografia de Alonso Barros, cuja marca do trabalho é a sensualidade e o humor. Tais características ficam claras já no número de abertura, “Wilkmommen”, no qual o mestre de cerimônias apresenta os dançarinos enquanto a dança aperfeiçoa a definição dos seus nomes artísticos (Rosa, por exemplo, se exibe sensualmente enquanto o mestre diz que o seu nome deve-se ao fato de ela adorar mostrar o “botão”).
“Deixem os seus problemas lá fora”, pede o mestre de cerimônias, “aqui dentro, a vida é linda”. Cabaret há anos ousa lidar com temas controversos – a liberdade sexual, o nazismo, a prostituição – para transmitir a simples mensagem de que você pode parar de se preocupar e ser quem quiser.
*Estudante de Jornalismo da UFRGS